A questão de Lógica no 1o exame de qualificação da UERJ – vestibular 2016

Hoje de manhã, foi realizado o 1o exame de qualificação do vestibular de 2016 da UERJ.

Fui ver agora a prova. Uma das questões (a de número 14) me chamou a atenção. Ela diz:

Antônio Prata, ao comentar o ataque ao jornal Charlie Hebdo, construiu uma série de variações do argumento típico do método dedutivo, conhecido como “silogismo” e normalmente organizado na forma de três sentenças em sequência.

A organização do silogismo sintetiza a estrutura do próprio método dedutivo, que se encontra melhor apresentada em:

(A) premissa geral – premissa particular – conclusão

(B) premissa particular – premissa geral – conclusão

(C) premissa geral – segunda premissa geral – conclusão particular

(D) premissa particular – segunda premissa particular – conclusão geral

Há vários equívocos na questão.

Em primeiro lugar, não se pode afirmar que “o método dedutivo é conhecido também como silogismo”. Eles não são a mesma coisa. Todo silogismo é um caso de raciocínio dedutivo, mas nem todo raciocínio dedutivo é um silogismo. A dedução é uma operação mental; o silogismo é a forma lógica dessa operação.

Em segundo lugar, o texto diz que “normalmente o silogismo está organizado na forma de três sentenças em sequência”. O enunciado diz “normalmente”, mas o que é “normalmente”? Afinal, o silogismo pode também ter somente duas sentenças (entimema) ou mais de três (polissilogismo, sorites). Entimema, polissilogismo e sorites são tão casos de silogismo quanto o categórico: não são nem mais “normais” nem menos “normais”. A afirmação do enunciado é equivalente a dizer: “nas palavras de língua portuguesa, normalmente a consoante B é seguida da vogal A”. Não faz sentido. Há diferentes tipos de silogismo, e nenhum pode ser considerado “mais normal” que outro, do mesmo modo que não se pode considerar que uma sílaba seja considerada “mais normal” que outra. “Silogismo normal”… só se inventaram um novo tipo de raciocínio!

Em terceiro lugar, o comando da questão propõe que se indique “a melhor apresentação do silogismo” ou da “estrutura do método dedutivo”. Como assim, “silogismo melhor apresentado”, “estrutura do método dedutivo melhor apresentada”? Afinal, há inúmeras possibilidades de apresentar a estrutura lógica do silogismo, e não existe nenhuma razão racional para dizer que uma é “melhor” do que outra. Dizer que existe uma forma de expor o silogismo “melhor” do que outra expressa um juízo de valor, não uma regra lógica. Por isso, o comando da questão é, do ponto de vista lógico, absurdo.

Em quarto lugar, as alternativas dizem “premissa geral”, “premissa particular” et cetera, nessa linha. Ora, isso é simplesmente errado. Na lógica dedutiva não existe “premissa geral” nem “premissa particular”. Afinal, não se trata simplesmente da utilização de “termos gerais” (como “todos”) ou “particulares” (como “este”). É perfeitamente possível, por exemplo, fazer uma dedução somente utilizando “termos gerais”: “Todos os cariocas são fluminenses; todos os fluminenses são brasileiros; portanto, os cariocas são também brasileiros”. O que se utiliza em lógica dedutiva são “termo menor”, “termo médio” e “termo maior”, sem nenhuma relação necessária com ser “geral” ou “particular”. No exemplo dado, “carioca” é termo menor; “fluminense” é termo médio; “brasileiro” é termo maior. Por isso, não se pode falar em “premissa geral” nem “premissa particular”. O que temos no silogismo categórico é: uma premissa maior (que liga o termo médio ao termo maior); uma premissa menor (que liga o termo menor ao termo médio); e uma conclusão (que liga o termo menor ao termo maior, sem usar o termo médio).

Em quinto e último lugar, concluindo tudo o que foi dito acima, é simplesmente absurdo, errado, falso, dizer que a alternativa (A) – que seria a correta de acordo com o gabarito – é um exemplo “melhor” de silogismo do que a alternativa (B). Quer dizer que se for invertida a ordem da “premissa maior” (e não “premissa geral”) e da “premissa menor” (e não “premissa particular”), então o argumento deixa de ser um silogismo? Faça-me o favor!

Vou ilustrar isso tudo com um exemplo simples.

Veja:

(1) A prova de vestibular pode ter questões imperfeitas, pois é escrita por pessoas.

(2) A prova de vestibular é escrita por pessoas.

Logo, a prova de vestibular pode ter questões imperfeitas.

(3) Pessoas podem escrever questões imperfeitas.

A prova de vestibular é escrita por pessoas.

Logo, a prova de vestibular pode ter questões imperfeitas.

(4) As pessoas pertencem ao conjunto de seres que podem escrever questões de vestibular.

Questões imperfeitas podem ser escritas por pessoas.

Logo, provas de vestibular podem ter questões imperfeitas.

O raciocínio (1) é dedutivo, mas não está escrito sob a forma de silogismo.

O raciocínio (2) é dedutivo, é um silogismo, mas não apresenta uma de suas premissas: ele é um entimema, e tem uma de suas premissas meramente subentendida.

O raciocínio (3) é dedutivo, é um silogismo categórico, e apresenta primeiro a premissa menor e depois a premissa maior.

O raciocínio (4) é dedutivo, é um silogismo categórico, e apresenta primeiro a premissa maior e depois a premissa menor.

Todos são raciocínios dedutivos válidos (e olha que nem falamos de raciocínios dedutivos inválidos, que não deixam de ser raciocínios dedutivos por isso!). O argumento (1) é o único que não se constitui como silogismo. Todos os outros são silogismos perfeitamente “normais” (para falar como o enunciado). Não há um “melhor” (!) do que outro.

Mas, de acordo com a banca que formulou a questão da UERJ, somente o raciocínio (4) é um verdadeiro raciocínio dedutivo!!!

Como é possível que um conjunto tão completo de erros primários, grosseiros, totais tenha lugar numa questão de vestibular da UERJ?

Simulado ENEM – 60 questões com conteúdo de Filosofia

Ofereço aos meus leitores vestibulandos um simulado com 60 questões com conteúdo de Filosofia do ENEM.

Todas as questões foram extraídas de provas do ENEM de 2008 a 2012.

Este simulado é provavelmente a mais completa reunião de questões das últimas provas do ENEM com conteúdo de Filosofia disponível na web.

Desejo uma boa preparação!

Acesse o simulado em PDF aqui:

Simulado Filosofia ENEM – 60 questões

O gabarito está aqui:

GABARITO

 

Confira também:

SIMULADO ENEM – 80 QUESTÕES de Filosofia (2008-2013)

A prova de filosofia do vestibular UFRJ 2008-2009

A UFRJ divulgou a prova e o gabarito da primeira etapa do vestibular 2009.

Na prova de filosofia, a primeira questão é do tipo sorvete-na-testa. Bastava ser capaz de reconhecer em que sentido o enunciado “isto não é um cachimbo” é verdadeiro e em que sentido é falso, na pintura de Magritte.

A segunda questão é de lógica da argumentação. É necessário saber reconhecer um argumento dedutivo e um indutivo para resolvê-la. O nível da questão é extremamente básico, pois nem chegou a envolver a distinção entre premissas e conclusão.

A terceira questão é essencialmente de raciocínio verbal. O item (a) é respondido a partir da última proposição do texto; o item (b) deve ser respondido a partir justamente da pressuposição cética que afirma que o conhecimento pode ser enganoso.

Finalmente, a quarta questão é interpretativa. No item (a), é necessário compreender que o texto leva a uma resposta contrária à de Platão: segundo o trecho, a “voz corrente” afirma que praticar uma injustiça e não ser punido é melhor do que agir conforme a lei. Portanto, agir conforme a lei é um bem menor do que praticar injustiça e não ser punido. No item (b), é necessário raciocinar a partir do texto: se praticar uma injustiça e não ser punido traz um bem maior do que a injustiça não punida que se sofre, então seria vantajoso tolerar o mal sofrido em troca de poder praticar uma injustiça que traria ainda mais ganhos.

A prova não foi difícil, mas exigiu um nível de concentração maior do que a do ano passado. A partir dessa segunda prova de filosofia, começa a surgir um padrão: a UFRJ parece valorizar questões de interpretação e raciocínio verbal.

De qualquer modo, os alunos que se prepararam para a prova de Filosofia certamente tiveram um resultado melhor. Agora, estamos atentos à prova da UFF, dia 16.

Edital UFRJ 2009: novo curso no Grupo 6

Foi liberado recentemente o edital do vestibular UFRJ 2009.

No que interessa ao blog, que é o Grupo 6, que tem prova de Filosofia na 1a Etapa, uma novidade: o curso de Relações Internacionais.

Assim, do Grupo 6 participam os cursos de: Ciências Sociais, Direito, Filosofia, História, Música (todas as carreiras) e Relações Internacionais.

A prova de Filosofia do vestibular 2007/2008 foi fácil, por ser novidade. Neste ano, esperamos um grau de dificuldade maior.

O conteúdo programático permanece o mesmo: básico e genérico. Não indica claramente autores ou problemas, mas questões. O modelo da prova passada deve ser seguido: trechos de textos clássicos seguidos de enunciados que envolvem conhecimentos fundamentais de história da filosofia e de conceitos da tradição filosófica e capacidade de interpretação de texto.

 

Confira a página do vestibular da UFRJ: http://www.vestibular.ufrj.br/2009/home.html

Baixe o edital diretamente: http://www.vestibular.ufrj.br/downloads/Concurso_2009_Edital_45.pdf

A prova de Filosofia da UFRJ

A primeira prova de Filosofia no vestibular da UFRJ foi aplicada hoje e seu gabarito já está disponível online.

Todas as questões são fáceis e dependem mais da interpretação dos textos do que de conhecimentos filosóficos específicos.

A questão 1 é relativa ao conceito de filosofia, e a resposta do item (a) está óbvia no texto. A resposta do item (b) é fácil para quem estudou um pouquinho.

A questão 2 é sobre empirismo e racionalismo. Eu tinha certeza de que cairia uma questão de identificação e definição do empirismo ou do racionalismo. Para quem estudou, é a questão mais fácil.

A questão 3 é a única cujo assunto não está evidente no programa: o tema do contrato social está implícito no item que trata da política. É uma questão puramente interpretativa. Ninguém precisaria ter jamais lido uma linha sequer de Rousseau para responder corretamente.

A questão 4 é de resolução muito fácil, especialmente para quem estudou o problema do determinismo e da liberdade. De qualquer modo, mesmo quem nunca estudou filosofia poderia responder corretamente, pois a solução para o problema está evidente no texto introdutório.

Em linhas gerais, foi uma prova que confirmou nossas expectativas: questões interpretativas envolvendo conceitos filosóficos. Um aspecto inesperado foi a ausência de questões de lógica. Contudo, essa ausência pode ser justificada pelo previsível baixo nível de preparação da maioria dos candidatos, o que fez com que a banca preparadora das questões pegasse leve.

A prova estava fácil; mesmo alunos que nunca tiveram aulas de filosofia podem vir a ter boa nota. Claro que os alunos que tiveram uma boa preparação terão notas ainda melhores.

Enfim, foi uma prova que cumpriu exatamente o que prometia: introduzir a Filosofia como conteúdo do vestibular sem causar muitos arrepios. No ano que vem, certamente a dificuldade crescerá um pouco.

Prova de Filosofia UFRJ – Resumão do programa

 Atenção: este “resumão” de todo o conteúdo trabalhado por nós neste ano não deve ser utilizado como fonte única de estudo. Ele só deveria ser utilizado por quem já está bem preparado, com o objetivo de orientar os conteúdos gerais que poderão ser cobrados na prova UFRJ.

1. Como explicar o conceito de filosofia?

O conceito de filosofia pode ser explicado por seu objeto e por seu método. O objeto da filosofia é conceitual; a filosofia trabalha com conceitos que utilizamos no nosso dia-a-dia, que utilizamos nas ciências, nas artes, mas a respeito dos quais nunca pensamos. O método da filosofia é argumentativo e crítico: a filosofia é um tipo de conhecimento construído por meio do debate, do diálogo, da argumentação e que deve estar sempre aberto à reformulação.

2. Como a filosofia surgiu?

A filosofia surgiu na Grécia do século VI a.C. com homens que buscavam conhecer as coisas por meio da investigação empírica e racional, não aceitando a sabedoria da tradição como ponto de partida para o conhecimento.

3. Qual a relação entre mito e filosofia?

A filosofia nasce como uma reação contra as narrativas mitológicas que procuravam explicar todas as coisas por meio da existência e das ações dos deuses. A filosofia eventualmente utiliza-se de mitos como recurso retórico, mas busca superar a mitologia por meio da construção do conhecimento pelo trabalho argumentativo crítico.

4. Qual a diferença entre discurso narrativo, discurso poético e discurso predicativo?

O discurso narrativo tem como objetivo narrar um acontecimento factual ou mitológico. O discurso poético tem como objetivo apresentar uma visão de mundo por meio de imagens, utilizando estruturas poéticas. O discurso predicativo tem o objetivo de afirmar algo sobre alguma coisa, pôr um predicado num sujeito. O discurso mitológico é geralmente narrativo, ainda que tenha estrutura poética; os poemas são exemplos de discurso poético; e a filosofia é geralmente escrita como discurso predicativo.

5. O que é a controvérsia entre a filosofia e a sofística?

No século V a.C., o filósofo Sócrates defendia que o objetivo da filosofia era conhecer a verdade por meio da argumentação crítica. Sócrates defendia que existia uma verdade, e que para conhecê-la era necessário descobrir a própria ignorância (o que significa que a primeira tarefa da filosofia deveria ser a promoção do auto-conhecimento). Sócrates também considerava que um filósofo não deveria ser pago, pois a verdade não era artigo comerciável. Contudo, os sofistas, que eram contemporâneos de Sócrates, tinham outra visão a respeito da verdade. Eles achavam que a verdade era função da argumentação: quem tinha a maior força argumentativa era o proprietário da verdade. Os sofistas eram advogados profissionais e professores de retórica, cobrando pelos seus trabalhos. Sócrates considerava que os sofistas eram charlatões, pois ensinavam os alunos a vencer os debates e não a buscar pela verdade.

6. O que significa a divisão entre dialética e retórica?

A dialética é o método filosófico: a dialética é o trabalho de chegar ao conhecimento por meio da argumentação crítica e da análise dos argumentos. A retórica é uma arte: é a arte de vencer um debate e convencer por meio da utilização de argumentos, não importando se os argumentos são bons ou maus.

7. O que é um argumento?

Um argumento é um conjunto de proposições que justificam ou sustentam uma tese. Essas proposições aparecem como premissas e conclusão. Todo argumento tem uma ou mais premissas e apenas uma conclusão.

8. O que é a verdade e a validade?

A verdade é uma propriedade das proposições. Uma proposição pode ser verdadeira ou falsa. A validade é uma propriedade dos argumentos dedutivos. Um argumento dedutivo pode ser válido ou inválido. Mas um argumento nunca pode ser verdadeiro ou falso, nem uma proposição pode ser válida ou inválida.

9. Como identificar as premissas e a conclusão de um argumento?

As premissas de um argumento são as proposições que justificam, que sustentam, que explicam, que levam até a conclusão. A conclusão é a proposição que é justificada, que é sustentada, que é explicada pelas outras proposições. A conclusão é a tese defendida pelo argumento.

10. Qual é a diferença entre um raciocínio (argumento) dedutivo e um indutivo?

Um raciocínio dedutivo é um argumento que parte de uma proposição que tem a forma de uma lei geral para chegar a uma conclusão particular retirada dessa lei geral. A dedução estabelece uma relação entre conceitos. A dedução é uma relação puramente lógica; um argumento dedutivo pode ter todas as suas proposições falsas e ainda assim ser um argumento dedutivo válido. Um argumento dedutivo pode ser válido, quando sua forma lógica é correta, ou inválido, quando sua forma lógica não é correta.

Um argumento indutivo é um argumento que parte de elementos particulares que têm origem na experiência para chegar a uma conclusão geral e conceitual. A indução estabelece uma relação entre a experiência e um conceito. A indução não é uma relação puramente lógica: ela mistura a lógica com a experiência. Por isso, um argumento indutivo não pode ser considerado válido ou inválido; ele pode ser considerado apenas mais provável ou menos provável.

11. O que é o racionalismo?

O racionalismo é uma filosofia que enfatiza o papel da razão na aquisição e na justificação do conhecimento, em detrimento da experiência sensorial e empírica. Para os racionalistas, a razão é a fonte dos conhecimentos mais perfeitos e verdadeiros, enquanto a experiência sensível tem acesso apenas a conhecimentos imperfeitos. Para os racionalistas, o ser humano já nasce com alguns conteúdos da razão – como, por exemplo, a idéia de Deus.

12. O que é o empirismo?

O empirismo é uma filosofia que enfatiza o papel da experiência na aquisição e na justificação do conhecimento, minimizando o papel da razão humana. Para os empiristas, a própria razão humana é adquirida por meio da experiência. É empirista a idéia de que o ser humano, quando nasce, é uma espécie de tabula rasa, uma folha em branco.

13. O que é o ceticismo?

O ceticismo é uma filosofia que afirma que existem limitações ao conhecimento possível. Um cético filosófico não diz que a verdade não existe ou é impossível, mas que não podemos conhecer ou fazer afirmações sobre a verdade. O ceticismo é uma filosofia contrária ao dogmatismo, que afirma que a verdade é conhecida e que não há possibilidade de discussão sobre ela. O ceticismo não deve ser confundido com o relativismo, que afirma que a verdade é relativa, nem com o niilismo, que afirma que não há verdade.

14. Qual a relação entre criação artística e conhecimento científico?

A arte e a ciência têm algo em comum: ambas pretendem ser um meio de o ser humano compreender e agir, ordenando e tornando inteligível o mundo. Contudo, a ciência é feita a partir do método empírico e busca, por meio da razão e da experiência controlada, encontrar a verdade sobre a natureza. Já a arte não tem um método específico, mas vários métodos diferentes, e não visa necessariamente encontrar qualquer verdade.

15. O que é a questão da universalidade do belo?

A questão da universalidade do belo é o problema de saber se a beleza é um conceito universal e se algo considerado belo em determinada cultura e época será também considerado belo em outra cultura e época. O problema questiona se a beleza é uma característica objetiva da obra de arte (ou seja, se a beleza existe independentemente da perspectiva histórica e cultural do observador) ou se a beleza é subjetiva (ou seja, se a beleza está nos olhos de quem vê a obra de arte).

 

16. Quais as principais teorias estéticas que explicam a obra de arte?

16.a) A teoria da arte como imitação

A teoria da arte como imitação afirma que uma obra só é arte se imita algo, e será tanto melhor obra de arte quanto mais perfeita for a imitação.

16.b) A teoria da arte como expressão

A teoria da arte como expressão afirma que uma obra só é arte se exprime um sentimento do artista, e será tanto melhor obra de arte quanto melhor e mais profundamente exprimir esse sentimento.

16.c) A teoria formalista da arte

A teoria formalista da arte afirma que a obra de arte tem uma forma significante que provoca nos observadores emoções estéticas. Contudo, a beleza não está “nos olhos de quem vê”, mas na forma da obra de arte.

17. O que significa causalidade?

A causalidade é a idéia de que todo efeito tem necessariamente uma causa.

18. O que significa determinismo?

O determinismo é a idéia de que quando se conhece todas as condições iniciais de um sistema, pode-se prever o desenvolvimento futuro desse mesmo sistema.

19. Por que a idéia de determinismo impõe um problema para a compreensão da liberdade humana?

Porque se o determinismo for verdadeiro, então poderia ser previsto o comportamento das pessoas diante de determinadas condições. Contudo, se é possível prever o comportamento de uma pessoa, então essa pessoa não é livre, pois seu comportamento já estava determinado.

20. Qual é a diferença entre ética e moral?

A moral é a consideração do que é bem ou mal. A ética é o estudo das teorias que vão explicar a moral. A moral é a prática, a ética é a teoria.

21. Quais as principais teorias éticas usadas cotidianamente?

21.a) O relativismo moral

O relativismo moral é a teoria que afirma que as afirmações morais (isso é bom, aquilo é mau) são relativas à cultura. Para o relativista moral, não existe algo objetivamente bom ou mau; o relativista moral afirma que algo considerado mau em determinada cultura pode ser considerado bom em outra cultura. O relativista moral tende a considerar que “bom” é aquilo que é socialmente aprovado e “mau” é aquilo que é socialmente desaprovado em determinada cultura.

21.b) O absolutismo moral

O absolutismo moral é a teoria que afirma que existem valores morais objetivos. Para o absolutista moral, uma ação é boa ou má, independentemente da cultura à qual o agente pertença. O absolutista moral parte de princípios éticos definidos e deles deduz suas proposições morais.

21.c) O utilitarismo

O utilitarismo é a teoria que afirma que deve-se buscar maximizar os benefícios e minimizar os malefícios para a maior quantidade de pessoas. O utilitarista faz uma espécie de cálculo ético para chegar à conclusão de que uma ação é boa (a que maximiza os benefícios e minimiza os malefícios) e outra é má (a que não maximiza os benefícios e/ou não minimiza os malefícios).

22. Qual a diferença entre Estado, sociedade e poder?

Estado é uma organização social, política e jurídica de um povo que tem estrutura administrativa e governo próprio, com soberania sobre um determinado território. O Estado é produto das vontades individuais do povo e é onde essas vontades individuais podem ser realizadas. Sociedade é uma associação de indivíduos que repousa sobre um contrato social e cujos laços de reciprocidade instituem uma ordem econômica ou política. O poder é a capacidade de se mobilizar forças econômicas, sociais ou políticas para obter um certo resultado. Alguns filósofos (como Foucault) afirmam que todas as relações entre o Estado e os indivíduos e todas as relações sociais são relações de poder: o poder fundamental não é exercido por indivíduos, mas encontra-se disperso, como um aspecto impessoal da sociedade, e manifesta-se em particular sob a forma de vigilância, regulação ou disciplina, que adaptam os seres humanos à estrutura social envolvente. O poder da sociedade não se encontra limitado à sua capacidade de impedir as pessoas de fazerem coisas; inclui o controle da autodefinição e da forma de vida preferida dos seus membros.

23. Quais as concepções mais comuns de cidadania?

23.a) A social-democrata

A concepção social-democrata de cidadania visa garantir direitos civis, políticos e sociais a todos por meio do estado-providência.

23.b) A conservadora

A concepção conservadora de cidadania visa garantir o máximo de liberdade individual e autonomia para os cidadãos, diminuindo a capacidade do Estado interferir na vida privada de cada um.

23.c) A teoria da sociedade civil

A concepção dos defensores da teoria da sociedade civil centra sua atenção no modo como aprendemos a ser cidadãos responsáveis. Para eles, aprendemos a ser cidadãos participando de organizações civis.

23.d) A teoria liberal

A concepção liberal da cidadania enfatiza a necessidade de os cidadãos serem capazes de argumentar publicamente. Os cidadãos precisam dar razões para suas exigências políticas, e não apenas exprimir preferências ou fazer ameaças.

23.e) A teoria republicana

A concepção dos republicanos cívicos defende que os cidadãos responsáveis devem ter na participação política sua ênfase, e a vida política deve ser colocada à frente das outras atividades.

A filosofia nas suas origens: do mito aos sofistas

Na semana passada, alguns alunos solicitaram que eu escrevesse alguma introdução bem simples explicando os filósofos pré-socráticos, Sócrates, os sofistas…

Decidi preparar um textinho que aborda três itens do programa de filosofia do vestibular da UFRJ: mito e filosofia; filosofia e sofística; retórica e dialética. Segue o texto.

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DO MITO AOS SOFISTAS

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Mito e filosofia

Para compreender o processo intelectual que resulta na filosofia contemporânea é necessário conhecer a origem da filosofia.

O contexto histórico do surgimento da filosofia é a Grécia do século VII a.C. Naquele tempo, as cidades gregas conheceram um período de expansão econômica, militar e geográfica. Foram fundadas inúmeras colônias gregas na Europa e na Ásia Menor.

Até o século VII a.C., o contexto cultural do homem grego era dado pelas grandes narrativas míticas e poéticas de Homero, nas quais deuses e homens interagiam em confrontos e amores. Embora a idéia da interação de homens com deuses seja estranha a nós, que vivemos na cultura cristã, na época chamada homérica isso era muito normal. A explicação é que os gregos tinham então uma concepção naturalista a respeito de todas as coisas do mundo; tanto os homens quanto os deuses eram seres naturais e, portanto, podiam relacionar-se. (Só para lembrar, a concepção cristã é diferente: pressupõe um Deus que cria a natureza, mas não faz parte dela).

Talvez muitos de vocês pensem que a mitologia grega seja parte da filosofia. Essa é uma idéia bem difundida, mas que está errada. Para entender o porquê, é preciso compreender como o mundo grego das narrativas homéricas transformou-se no mundo grego da filosofia.

A partir da expansão grega, alguns fenômenos intelectuais começaram a acontecer. Nas cidades, instituiu-se a ágora, que era a praça pública onde os cidadãos encontravam-se para conversar, fazer política e fechar negócios. No campo político, surgem as primeiras legislações. Na arte, aparece o teatro.

Nas colônias gregas, os homens tinham contato com viajantes de várias partes do mundo conhecido. Assim, muitos gregos puderam conhecer a matemática, a astronomia, a geometria. E alguns desses gregos começaram a investigar a natureza. Natureza, aqui, não significa mato, bichinho, floresta: significa a totalidade das coisas físicas. Aliás, a palavra física vem do grego phisis, que significa exatamente natureza (no sentido bem amplo a que nos referimos).

Mas o que estes primeiros “físicos” buscavam? Inicialmente, duas coisas: em primeiro lugar, saber a constituição fundamental das coisas da natureza; em segundo lugar, saber como a natureza veio a ser o que é – ou, em outras palavras, como o universo, o cosmo, surgiu.

O ponto de vista tradicional sobre o surgimento da natureza antes desses primeiros “físicos” era mítico; por isso, eles fizeram uma verdadeira revolução quando começaram a procurar as respostas para suas questões não nos mitos, mas naquilo que podiam conhecer a partir da sua própria experiência.

Essa foi a grande revolução da filosofia no século VII a.C.: os primeiros “físicos” (que eram simultaneamente os primeiros “filósofos”, ou, como é comum chamá-los, os “filósofos pré-socráticos”) recusaram os mitos na busca pela explicação a respeito do surgimento e da constituição da natureza. Eles preferiram confiar em sua razão. Por isso, podemos afirmar que a filosofia e a ciência são a tentativa do ser humano de rejeitar o mito. O mito não é uma parte da filosofia; pode-se dizer mesmo que a filosofia faz-se contra o mito, que a filosofia é uma recusa do mito.

Filósofos pré-socráticos

Falei no parágrafo acima a respeito de “filósofos pré-socráticos”. Provavelmente muitos alunos já sabem que os filósofos pré-socráticos foram aqueles filósofos que nasceram antes de Sócrates. Mas isso não basta. É necessário saber minimamente quem foi Sócrates e o motivo pelo qual foi tão importante que criou uma divisão na filosofia: antes de Sócrates / depois de Sócrates.

Eu já disse que os primeiros filósofos (entre o século VII e V a.C.) investigavam dois problemas a respeito da natureza: em primeiro lugar, investigavam a constituição fundamental das coisas; em segundo lugar, investigavam como a natureza havia surgido.

Sócrates (que viveu no século V, que é considerado o século de ouro da Grécia e, especialmente, de Atenas, sua cidade) é um filósofo muito importante porque ele percebeu que, antes de investigar a natureza, era necessário investigar o próprio ser humano – afinal, a natureza só é investigada porque há alguém para investigá-la, e parece sensato estudar este alguém antes de partir para a investigação das coisas externas.

A maior preocupação de Sócrates era, de fato, mostrar que o auto-conhecimento é o que há de mais importante na vida de uma pessoa. E o primeiro conhecimento deve ser a consciência da própria ignorância. É por isso que Sócrates profere sua mais célebre frase: “só sei que nada sei”. Reconhecendo sua falta de sabedoria, Sócrates podia dedicar-se a tentar obtê-la; e o desejo de obter a sabedoria que reconhece não possuir faz dele, paradoxalmente, o homem mais sábio.

A filosofia posterior a Sócrates, incluindo a filosofia praticada em nosso tempo, é socrática porque, à semelhança do filósofo de Atenas, não se contenta em investigar as coisas como elas são (como faziam os filósofos antes dele, os “pré-socráticos”), mas procura compreender como nós entendemos as coisas do modo que as entendemos. Além disso, Sócrates foi um dos primeiros a compreender a importância da discussão quando se pretende chegar à verdade – e toda a filosofia subseqüente aproveitará o método dialético na busca pelo conhecimento. A partir de Sócrates, fica claro que o conhecimento filosófico não é produto do acordo, mas da polêmica dialogada entre iguais.

Os sofistas

Referi-me ao método dialético no parágrafo acima. Para poder explicar o que é isso, é necessário antes apresentar um conjunto de sábios que participava da vida de Atenas e de várias outras cidades na época de Sócrates: os sofistas. Eu disse “conjunto de sábios”, mas essa expressão pode ser duplamente enganadora. Em primeiro lugar, não era um verdadeiro conjunto, pois os sofistas eram homens bem diferentes entre si, e seus ensinamentos não eram semelhantes. Muitas vezes, aliás, eles eram adversários uns dos outros. Em segundo lugar, muitos não considerariam os sofistas como sábios, pois os filósofos da Antiguidade tinham a tendência de considerar os sofistas como enganadores e manipuladores.

Por que, então, eu afirmei que eles eram um “conjunto de sábios”? Vamos ver primeiro em que sentido os sofistas podem ser considerados sábios.

Os sofistas eram homens oriundos de várias cidades e colônias gregas que viviam viajando de pólis em pólis oferecendo o uso e o ensino de suas habilidades. As habilidades dos sofistas eram relacionadas à capacidade de convencer. Os sofistas, portanto, ofereciam seus serviços na defesa e na acusação em julgamentos, sendo os primeiros advogados profissionais; e, com a fama que eventualmente ganhavam, podiam cobrar (bem caro, aliás) para ensinar a jovens a arte de vencer disputas argumentativas, transformando-se assim nos primeiros professores de retórica. Lembre-se de que nas democracias gregas a capacidade de discursar e de convencer era considerada o melhor meio de ascender social e politicamente.

Era devido à habilidade de defender igualmente bem duas teses diferentes e mesmo opostas, independentemente de qual fosse a tese verdadeira e de qual fosse a falsa, que os sofistas foram desprezados pelos filósofos – que, ao contrário dos sofistas, procuravam argumentos para encontrar a verdade e escapar ao erro. Por outro lado, justamente a facilidade de defender qualquer ponto de vista fazia com que os sofistas fossem muitas vezes considerados sábios, e é por isso que eu afirmei acima que eles o eram.

Finalmente, os sofistas podem ser estudados como um conjunto porque todos eles praticavam, embora cada um a seu modo, a argumentação como forma de vencer uma disputa, não importando onde estivesse a verdade. Aliás, a própria noção de verdade era relativa à força da argumentação: em última análise, a posição mais fortemente defendida seria a posição verdadeira. Eis outro motivo que levava os filósofos, que amavam a verdade (compreendida como algo que é independente da força dos argumentos, mas que existe independente da vontade das pessoas), a detestarem os sofistas.

A retórica e a dialética

Agora finalmente podemos compreender o que é o método dialético, questão que levantamos mais acima. Dialética é um método filosófico: é a busca pela verdade por meio da análise cuidadosa dos argumentos. A dialética não era praticada pelos sofistas, pois a dialética procura pela verdade, e os sofistas apenas defendem uma posição pré-determinada.

Os sofistas não usavam a dialética: usavam a retórica. A retórica é o bom uso dos argumentos para defender uma posição. Esses argumentos, inclusive, podem ser maus argumentos, podem ser argumentos que não têm valor lógico mas que têm capacidade de convencimento; a esses argumentos enganadores, aparentemente sólidos mas na verdade falhos, os filósofos passaram a chamar “sofismas”. Isso vem bem a calhar, pois os sofistas não tinham pudores de usar argumentos falhos, desde que isso os ajudasse a defender seu objetivo.

Percebemos então que dialética e retórica são dois tipos de utilização da argumentação. A dialética é o tipo de argumentação filosófica, e visa o conhecimento e a verdade. A retórica é o tipo de argumentação dos sofistas (e, por conseqüência, dos advogados), e visa o convencimento e a vitória no debate. Aliás, a retórica é muitas vezes considerada uma arte: a arte de convencer.

Podemos dizer então que o que define a filosofia, desde seu início no século VII a.C. com os filósofos pré-socráticos, é a busca pelo conhecimento – uma busca que não é empreendida a partir de mitos nem é realizada com o objetivo simplesmente de convencer. O conhecimento almejado pela filosofia é o conhecimento que o ser humano pode alcançar por meio de seus próprios esforços racionais.

O conhecimento verdadeiro atingido pela razão humana é o objetivo da filosofia desde a Grécia antiga; contudo, os problemas filosóficos sofreram inúmeras e enormes modificações desde então, os métodos disponíveis hoje são muito mais poderosos do que eram no tempo de Sócrates, e as respostas são bem mais complexas do que aquelas dadas na Antiguidade. Ainda assim, a filosofia segue, durante a história, um fio condutor contínuo. Não seria possível compreender o que é a filosofia hoje e o que os filósofos de hoje fazem sem entender o que os primeiros filósofos faziam na origem da filosofia.

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Filosofia no vestibular da UFRJ

Como vocês sabem, o vestibular 2008 da UFRJ tem prova de Filosofia para os concorrentes aos cursos de Direito, História, Ciências Sociais, Filosofia e Música.

A prova de Filosofia será não-específica e constará de quatro questões. A nota máxima que um vestibulando da UFRJ pode alcançar é 60.0, e o peso da Filosofia parece pequeno: em valores absolutos, cada questão vale 0.5 ponto, o que significa que a prova vale 2.0 pontos em 60.0.

Dois pontos que, todavia, podem significar a diferença entre passar no vestibular ou não passar.

Nesta primeira experiência com Filosofia no vestibular, a UFRJ não vai pegar pesado. Não serão cobradas questões sobre História da Filosofia, por exemplo.

As questões certamente apresentarão um mix de problemas interpretativos, problemas de compreensão de conceitos filosóficos e problemas de Lógica.

A interpretação de textos filosóficos requer duas habilidades: em primeiro lugar, é necessário saber interpretar textos, o que vocês aprenderam a fazer desde o ensino primário; em segundo lugar, é necessário conhecer conceitos filosóficos específicos utilizados nos textos.

Para conhecer conceitos filosóficos, não há outra saída senão assistir a aulas de Filosofia ou ler bons livros de Introdução à Filosofia.

Para saber resolver exercícios de Lógica, é necessário, além de bom-senso, conhecer minimamente alguns termos e algumas regras, além de ter feito exercícios. Por sorte, a Lógica exigida na prova da UFRJ é muito elementar: é necessário apenas saber trabalhar premissas e conclusão em argumentos dedutivos e indutivos.

De qualquer modo, vocês, meus alunos, já estudam com vistas à prova desde o início do ano, e tenho a certeza de que estarão preparados em novembro.